domingo, 23 de janeiro de 2011

Esquecimento

O cansaço... as pálpebras tremem, o coração custa a bater. Solidão. A única coisa que escuto é o tic-tac do relógio, que já marcou minhas felicidades e agora marca minhas tristezas e frustrações. Estou num quarto escuro, onde há uma cama e um criado-mudo, madeira velha, cortinas gastas, meus grandes amigos desses últimos tempos, mudos como eu, velhos como eu. No meu quarto não há janelas, estou numa vida sem janelas e só há uma porta.

Meu sangue range demoradamente pelas minhas artérias. Estou velho. O futuro deixa de ser uma perspectiva, agora só sei do meu passado, dos meus amores, das minhas alegrias e dos meus erros. Trabalhei durante anos, criei três filhos sozinho, fiz de tudo para que eles estudassem, se formassem, fossem felizes... Um pai só é feliz quando seus filhos o são. Depois que se mudaram pra Bauru (SP), os três médicos se casaram e tiveram filhos, mas os filhos se esqueceram do pai e o resultado foi o asilo em que me encontro.

Trabalhei feito louco para acabar retornando ao ponto de partida, minha irmão até tentou cuidar de mim, mas eu não quero incomodar, ela está tão velha quanto eu.

Às vezes acho que a única que verdadeiramente pode me ajudar e me acolher, e que jamais me deixaria na mão é esta cidade. Goiandira, terra branca, terra boa, terra velha, de pessoas boas e filhos ingratos.

Mas o que se pode fazer? O meu tempo já passou, o velho relógio está prestes a dar o último badalo e minha respiração o último gostinho de ar. Se eu pudesse gritar mais uma vez chamaria a enfermeira para me vestir decentemente, não queria chegar maltrapilho, seria muita desonra, mas acho que não vai dar tempo, espero que Deus não se importe muito...  

Até mais ver...


Em memória de Geraldo Tristão, que nos deixou sua música e sua história de vida. Obrigado!

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